quinta-feira, dezembro 20, 2007

Dom Duarte

por Tomaz Dentinho


Dom Duarte veio à Terceira inaugurar as novas instituições da AMI. À noite houve um jantar promovido pela Real Associação da Ilha Terceira. Estive presente no jantar e é sobre o que lá se disse que vale a pena falar.

Primeiro percebi melhor o sentido da obra de Fernando Nobre. Não há dúvida que tem capacidade para mobilizar meios financeiros, materiais e humanos para o serviço social. O segredo que terá é o de adaptar a cada sítio aquilo que é aí necessário. Providenciar dormida aos familiares de pessoas doentes que são internadas em São Miguel é dar resposta a uma necessidade que se fazia sentir de forma crescente, aliás como já comprovavam as iniciativas de alguns municípios mais remotos que tinham apartamentos disponíveis para os seus munícipes em Ponta Delgada. Em Angra essa função já estaria preenchida por outras instituições ou então a política de saúde regional tratou de subalternizar o Hospital de Angra. O facto é que a AMI preferiu orientar a sua actuação para a distribuição de medicamentos e para o apoio aos mais desfavorecidos. A Igreja pode-se ressentir desta intromissão civil naquilo que costuma ser a sua esfera de actuação social mas a verdade é que quem não é contra nós é certamente por nós. De qualquer forma foi bom ter assistido à ligação entre a AMI e a Casa Real.

O segundo aspecto que importa falar tem a ver com o discurso de Dom Duarte, em complemento das palavras de boas vindas proferidas por Valdemar Mota. Do que me lembro disse três coisas importantes. Disse que estavam em preparação as comemorações do assassinato de Dom Carlos onde se iria relembrar a vida e obra daquele marcante rei de Portugal que – conforme disse Dom Duarte - se fosse conhecido pelos assassinos, certamente não o teriam morto. E como os assassinos de Dom Carlos somos de facto todos nós, que vivemos em República e que ainda não pedimos desculpas por termos morto o Rei, o que Dom Duarte quis dizer foi que, se conhecêssemos a monarquia certamente não a teríamos morto. Disse também que fazia pouco sentido criticar as edificações de muitos construtores civis quando basta uma assinatura de um arquitecto conhecido para destruir o ambiente urbano de uma cidade histórica. Basta olhar para a nossa Caixa Geral de Depósitos ou para a famigerada frente marítima de Angra para todos entendermos a mensagem do nosso rei. Terá dito também, assim interpreto, que a Monarquia pode coexistir com a República, aliás como demonstra o seu testemunho de décadas. Bastaria que os Presidentes da República fossem mais seguros da sua posição para que pudessem solicitar e estimular o desempenho do monarca. Mas a verdade é que só conseguem isso no fim dos mandados e na assunção de que ficaram aquém do que conseguiriam fazer em complemento da Casa Real.

O terceiro aspecto que aqui vos reporto já se passou sem o Senhor Dom Duarte. Lamentavam os meus companheiros que a Terceira estava a perder peso para São Miguel, que Angra se estava a transformar numa vila, que qualquer dia nem teríamos o Representante da República, nem Bispo nem Secretarias Regionais. Naturalmente que constatei essa tendência mas demonstrei que a culpa era em grande parte dos terceirenses. Têm um Bispo mas não saem à rua em dia de procissão como fazem em São Miguel. Têm uma Universidade mas nunca se identificaram com ela, a ponto de não haver qualquer placa a indicar o caminho; existe a placa para os Montanheiros, para o Instituto disto e daquilo mas nada sobre a Universidade. Tiveram o porto mais importante dos Açores mas fizeram tudo para o fechar. Têm o melhor aeroporto das ilhas mas admitem que o seu uso seja condicionado para uso militar mesmo quando não há guerra. Têm possibilidade de ter cursos de jornalismo, de arquitectura, de governança e de paisagismo mas preferem condicionar a sua criação. Estão no centro do arquipélago mas preferem a defesa provinciana e inútil da ilha.

Fonte: A União, Quinta-Feira, dia 20 de Dezembro de 2007

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