terça-feira, setembro 09, 2008

5 de Outubro, 25 de Abril - Monarquias e Repúblicas

Há, decerto, vários tipos de "repúblicas", e ainda variações em cada um desses tipos.

Em algumas repúblicas distinguem-se claramente os poderes do parlamento e dos governos; noutras não.

Algumas repúblicas asseguram os direitos civis; outras não.

Algumas repúblicas realizam eleições livres; outras não.

Algumas repúblicas têm como chefe do Estado o chefe do governo; outras não.

Algumas repúblicas são controladas por militares; outras não.

Algumas repúblicas são controladas por um ou vários partidos políticos; outras não.

Algumas repúblicas são controladas por uma ou várias famílias ou clãs; outras não.

Algumas repúblicas são controladas por um ou vários sindicatos financeiros; outras não.

Em algumas repúblicas os poderes do Estado realmente exercidos são definidos pelas leis; noutras não.

Em algumas repúblicas, há presidentes com maiores poderes do que os primeiros-ministros dos monarcas absolutos do século XVIII; noutras não.

Este último ponto é fundamental. Por mais comparações que se façam entre as monarquias e as repúblicas, é forçoso concluir que na Europa actual o REPUBLICANISMO tanto pode ser praticado nas monarquias como nas repúblicas. E é ainda forçoso concluir que algumas repúblicas de fora da Europa são muito semelhantes às monarquias absolutas do século XVIII.

E, ainda a propósito, foi Lester B. Pearson, um primeiro-ministro do Canadá (de uma monarquia exemplarmente republicana) quem disse que nunca se tinha sentido tão «royal» (membro da realeza) como quando tinha visitado a "República Francesa". Creio que se percebe o sentimento de Pearson se nos lembrarmos que a França já teve presidentes que se tornaram monarcas-imperadores, como Napoleão III, ou, no dizer do Le Monde, "monarcas-presidentes" como o general Charles de Gaulle...

Foi isto o que me ocorreu ao ler o seguinte apontamento de Saldanha Sanches sobre o "5 de Outubro e o 25 de Abril". Obrigado, Fernanda Leitão, por esta oportuna sugestão de leitura:


O centenário do 5 de Outubro está próximo e as comemorações do 5 de Outubro - e em especial o cinquentenário da comemoração da República, que coincidiu com a decadência do salazarismo - foram marcos na resistência. Todos sabemos isso. A contraposição do regime democrático do princípio do século ao regime autoritário vigente funcionava como um argumento chave na narrativa democrática.

O 25 de Abril teve essa componente ideológica e essa componente institucional. A comparação entre as liberdades republicanas e o autoritarismo salazarista era uma parte essencial do discurso oposicionista. Aquilo que sobrava dos políticos republicanos (alguns aderiram ao novo regime) teve uma importância idêntica na construção de uma alternativa: sempre que havia eleições e possibilidade de agitação, o PCP agia com a cobertura dos veteranos da República e dos republicanos pós-república.

Mas - e este mas não é uma mera restrição secundária - o 25 de Abril serviu também para demonstrar o vazio democrático da República.

Comecemos pelo 5 de Outubro que conhecemos da reconstituição histórica e façamos a comparação com o 25 de Abril: a revolta republicana teve o apoio dos republicanos e de uma parte do movimento operário. Nada que possa comparar-se ao extraordinário apoio popular, a mobilização total da rua a que assistimos no 25 de Abril.

Para não falar do sufrágio universal (só depois do 25 de Abril) ou do fim daquela tradição monárquica das eleições saírem dos governos em vez dos governos saírem das eleições. Outra novidade absoluta da política portuguesa. Na República como na monarquia imperava o caciquismo propriamente dito (com donos de votos) e as chapeladas eleitorais eram moeda corrente. O Morgado das Perdizes sobreviveu (com novas formas) à implantação da República e as consultas ao eleitorado continuaram a ser dominadas e predeterminadas pela manipulação dos governos.

Tudo isto deve ser recordado quando se comemora a criação de um regime republicano em Portugal: um regime democrático cujas fragilidades e fraquezas estiveram na origem do regime salazarista que foi o seu sucessor imediato.

fonte:

http://caminhosdamemoria.wordpress.com/2008/09/04/5-de-outubro-25-de-abril/

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